Paraíso e o dia Internacional do Rock
A
história do rock numa cidade tipicamente sertaneja
Por
Rafael Cardoso
A música e a arte paraisense estão
profundamente enraizadas em suas tradições regionais. Com uma cultura intimamente
ligada a vida do campo, não é segredo para ninguém que o que mais se curte por
aqui é o som sertanejo. Segundo
levantamento realizado nas principais rádios da cidade, entre as dez músicas
mais pedidas, sete são executadas por duplas ou cantores sertanejos.
Contudo, como toda regra possui suas
exceções, Paraíso sempre teve sua reserva de amantes do bom e velho “rock and
roll” e, talvez poucos saibam, mas em todas as épocas a cidade teve bandas
locais que carregaram a bandeira do estilo com grande disposição e fervor.
História
do rock paraisense
A primeira expressão paraisense do rock que
se tem notícia é a banda “Os Sapos”. Formada no ano de 1968, pelos meninos
Arthur, Haroldo, José Luis, Rubinho e Mauro, no exato instante em que o mundo
fervia ao som dos Beatles, eles foram os maiores representantes da Jovem Guarda
na cidade, ficando conhecidos por toda a região.
O talento e a atitude dos “Sapos” os conduziram
a um sucesso surpreendentemente explosivo, levando-os a tocar em programas de
televisão na antiga emissora Itacolomi, de Minas, além da lendária TV Tupi. “Chegamos a ter problemas para andar nas ruas
de algumas cidades”, disse Artur, que é músico até hoje e uma espécie de
patrimônio cultural de Paraíso. “A
tietagem era tão forte que, na cidade de Andradas, as fãs chegaram a rasgar
nossas roupas”, completou o músico que hoje faz dupla com Ângela, sua
esposa, num projeto de Música Popular Brasileira.
Com o fim dos Sapos, o próprio Artur - que se
denomina “um paraisense urbano” -
participou de diversos outros projetos voltados para o rock nos anos seguintes.
Entre eles, a Banda “Feitiço”, que nos anos
70 animou as noites na boate do Clube Paraisense, tocando sons que iam desde Pink
Floyd, Santana, até Bill Haley and the Comets.
Mais tarde, fundou a Band Aids, que nos anos
80 participou das primeiras exposições agropecuárias de Paraíso, bem no início
da Expar e tocaram em muitas das famosas “brincadeiras dançantes” promovidas
por alunos da Escola Estadual Paraisense.
Nessa mesma época, a chama do rock começava a
se espalhar, atingindo outros jovens da cidade. Juancarlo Borges foi uma dessas
pessoas que manteve acesa a tocha do estilo por aqui. Unido a um grupo de
amigos, entre os quais cita “Silvio
Nóbrega, Lívio Calafiori e Luis Antônio de Queiróz”, semanalmente eles se
encontravam na garagem da casa de seu pai, o advogado Olavo Borges, bem no centro
da cidade. Atuando na área da terapia sistêmica, Juan conta que a história da
banda começou com um equipamento de som completo que seu pai recebeu em
pagamento de uma dívida. Foi assim que, da noite para o dia, todos os
instrumentos foram parar na garagem de sua casa e diante do evento quase
milagroso, os amigos iniciaram os ensaios, tocando temas de bandas como Led
Zeppelin, Van Halen e Alice Cooper.
Com um tom de pesar, o terapeuta lamenta
dizendo que “infelizmente, fomos só uma
banda de garagem que nunca chegou a tocar em evento algum”, mas relembrou com
carinho os momentos que o rock lhe proporcionou na adolescência.
No final dos anos 80 - início dos 90 -
começaram a surgir na cidade várias bandas. Uma delas acabou se
profissionalizando, tomando o caminho dos bailes e tornou-se um dos grupos paraisense
com maior longevidade. A banda Eclipse viajou Brasil afora por cerca de 10
anos, levando um excelente trabalho musical em muitas das maiores festas e
exposições do país. Mesmo tocando de todos os estilos populares da época, eles nunca
abandonaram sua raiz no rock e chegaram a participar de alguns eventos do
gênero, tocando o estilo sempre com competência.
Um desses eventos foi fruto da iniciativa
conjunta do antigo bar JR Silão, do locutor Ricardo Alexandre, da Paraíso FM e do
jornalista Valmir Bononi, da TV Paraíso. Em 1992 eles realizaram o 1º Fest
Rock, no Clube Paraisense (primeiro e único, vale salientar), o qual contou com
a presença das bandas Eclipse e Rock n’ Cover, de Paraíso e também da Alquimia,
de Franca.
O empresário Rodnei Carvalho era o vocalista
da Rock n’ Cover, banda que abriu o 1º Fest Rock. Com 19 anos na época, ele comenta
que o evento foi muito bom e que reuniu centenas de pessoas no Clube, mas também
relembra as dificuldades de se ter uma banda de rock naquela época. “Não tínhamos acesso a bons instrumentos e
equipamentos, como hoje”, disse Rodnei, sobre a precária estrutura dos
velhos tempos.
Ao lado de Mateus Gonçalves (já falecido),
Drausio Rossi, Marlon Ozelin e Ricardo Peres, o empresário/cantor, hoje
vocalista da Rock History, participou de vários eventos na cidade, a maioria,
festas de grêmios estudantis, onde tocavam músicas do Ultraje a Rigor, Sex
Pistols, U2 e Legião Urbana.
Outra banda dos anos 90 que tem sua história
iniciada em Paraíso é a Volúpia, que unia músicos daqui e também da vizinha
Passos. Com o passar dos anos, migrou para São Paulo, onde o guitarrista e
vocalista Toninho Lobato foi morar e deu continuidade ao trabalho que permanece
até os dias atuais.
Paraíso teve também uma banda de rock extremo,
o chamado Death Metal. A Cordemos não teve uma vida muito longa, pois seus
integrantes acabaram se mudando para outras cidades.
Chegando ao século XXI, as manifestações do
rock na cidade ficaram por conta dos festivais realizados no Porão Bar. Por
cerca de um ano e meio, praticamente todos os finais de semana movimentavam um
grupo de aficionados pelo estilo no local onde funcionava também um estúdio de
tatuagem.
Flamarion dos Santos, proprietário do estúdio,
lembra bem daqueles eventos que aconteceram entre os anos de 2004 e 2006.
Bandas como Crust, 200 Cigarros, Blaa, Mr. Burns, Nefilins, Destroyers e The
Face foram lembradas pelo tatuador paraisense, que trabalha nesse ramo desde
1999.
Com ingressos vendidos por apenas R$1,00, os
Festivais do Porão Bar movimentavam bastante gente e algumas edições do evento
chegaram a ter públicos extraordinários. “Um
dos festivais que me lembro bem, foi o que tocou Janis Joplin Cover... uma
noite espetacular!”, disse Flamarion, garantindo que centenas e de pessoas
passaram pelo local durante todo aquele dia.
Outras bandas ainda podem ser citadas, como Revolver,
Rock History, Custom, The Benders, as meninas da Sexo Frágil e também, Pólvora
Vermouth, que tem animado grandes festas da cidade e região com seu rock pop, chegando
a abrir recentemente com uma acústico o Show do Capital Inicial, na Expar.
Influência do rock na cidade
Devido ao crescimento do gosto pelo gênero,
ultimamente, algumas casas noturnas e bares têm se voltado para o estilo,
abrindo suas portas para o público do rock.
Um exemplo disso é o Shamrock Minash Pub, um
bar inspirado nos pubs irlandeses que, com menos de um ano de atividades, já
vem atraindo pessoas de diversas cidades da região.
Adriano Marques e os irmãos Hélio Lucas e
João Eduardo são jovens empreendedores paraisenses que encontraram no rock uma
oportunidade de proporcionar algo diferente na vida noturna da cidade.
Hélio Lucas destaca que a casa tem lotado em
praticamente todos os eventos que realiza. A razão disso, segundo ele é que “o
público sabe exatamente o que vai ouvir quando vai ao Shamrock. Sempre tocamos
Rock n’ Roll”, disse o empresário, fã de bandas como Creedence, Beatles e Guns.
Para não desapontar sua clientela, bandas com
identidades bem definidas são trazidas ao palco da Casa, para noites exclusivas
de rock dos anos oitenta, e covers de estrelas, como Pearl Jam e Led
Zepellin.
Outra casa que assimilou o rock em seu estilo
é o Único Lounge Bar. Com quatro anos de atividades, o Bar dos amigos Inácio e
Marcio Duarte, faz uma belíssima homenagem a música mundial, com ênfase nas
mais clássicas bandas de rock da história.
Marcinho, como é conhecido, é fã de bandas
clássicas como Doors, Pink Floyd, Iron, Metallica, Sepultura, Black
Sabbath, entre outras e, certamente, os discos espalhados pelas paredes do
Único têm relação com seu gosto pessoal. “Minha relação com o rock vem da
infância, quando ainda colecionava fitas cassetes de várias bandas”, ele disse.
“Hoje tenho um acervo gigante, principalmente de rock”, garante o dono da Casa,
que também recebe artistas e bandas que tocam jazz, blues e bossa nova, dizendo
que apesar do Bar ter um pouco dessa marca rebelde do rock, recebe um público
bastante diverso, desde jovens até pessoas de terceira idade.
Estaria o rock crescendo em Paraíso?
Apesar de possuir muitos costumes e
tradições, a cultura de nossa cidade demonstra adquirir novos hábitos
com o tempo, os quais vêm gerando transformações sociais com naturalidade. É
perceptível que além da arte sertaneja, tradicionalmente cultivada em Paraíso,
um remanescente fiel ao movimento da música rock se manteve sempre em busca de
seu espaço, realizando eventos e crescendo paulatinamente.
Com o passar dos anos e das décadas esse
grupo de fãs do rock parece estar em franco crescimento, alcançando maiores
proporções por aqui. Prova disto, são as bandas do primeiro escalão do rock
nacional que têm realizado shows na cidade, sempre prestigiados por bons
públicos. Nomes como Capital Inicial, Paralamas do Sucesso, Charlie Brown Jr.,
CPM 22, Detonautas, Titãs e Skank já pisaram neste solo, realizando
apresentações de grande sucesso. Os números demonstram, no entanto, que o
remanescente do rock paraisense já não é mais formado por meia dúzia de
adolescentes rebeldes.
Fica a pergunta: Estaria o rock
crescendo em Paraíso?
Escrita para a Revista Expressão Livre
Escrita para a Revista Expressão Livre
Comentários
Postar um comentário