Os 317 dias da São Sebastião do Paraíso colonial



Fundada menos de um ano antes do ‘Grito da Independência’, Paraíso é fruto direto do crescimento emanado pelo primeiro ciclo econômico brasileiro: o garimpo.

Por Rafael Cardoso
As origens de São Sebastião do Paraíso estão em plena conexão com a história da independência do Brasil. Criada menos de um ano antes do “Grito” entoado por D. Pedro I às margens do Ipiranga, nossa cidade é fruto real e direto de um Brasil que dava seus passos mais decisivos no rumo de se tornar uma nação soberana.
Sem a presunção de dar uma visão histórica exata daquele período - visto que para tanto, faz-se necessário aprofundamento técnico e científico para o qual não temos dados satisfatórios – apresentamos uma espécie de devaneio, em busca de recordações antigas de um tempo remoto que, como cidadãos, recebemos oralmente de nossos antepassados.
A partir de informações contidas em alguns livros escritos por historiadores da história municipal, os quais possuem características mais narrativas do que científicas, procuramos expor um cenário possível desse período embrionário de nossa cidade, traçando um paralelo com o ato da Independência do Brasil, que no último dia 7 de setembro completou 190 anos.

“Passando por grandes transformações, o Brasil pré-independência vivia permeado em profundas reformas políticas, econômicas e sociais, desencadeadas com a chegada da Família da Real Portuguesa por aqui, em 1808. Os portos brasileiros foram abertos às demais nações do mundo, desvinculando nosso comércio do monopólio imposto pelo antigo pacto colonial, o que foi, do ponto de vista econômico, o primeiro “grito de independência” da nação. Produtores agrícolas e comerciantes nacionais passaram a crescer em seus negócios, experimentando um novo tempo de prosperidade. Era a liberdade que passava a ser sentida no bolso dos brasileiros, transformando a realidade nacional de simples zona de exploração a categoria de reino.
Dentre à numerosa comitiva que acompanhou D. João VI, em sua mudança para o Brasil, houve muitos que não permaneceram no Rio de Janeiro, mas que, audaciosamente, aventuraram-se pelos sertões de Minas Gerais, em busca do sonho do ouro. Uma cidade que recebeu constantes “visitas” desses garimpeiros foi nossa vizinha, Jacuí, que foi explorada por anos a fio, numa fazenda que pertencia a um bandeirante chamado Manuel Botelho Netto, o qual fez fortuna garimpando o precioso metal e plantando cana de açúcar. Ainda hoje é possível ver os vestígios das escavações e os grandes montes de cascalho, atrás da igreja no centro da pequena cidade.
São Sebastião do Paraíso teve sua origem na devoção de uma família, cujo chefe era o senhor Antônio Antunes, figura controvertida e que, segundo a voz popular, era de família formada por “homens valentes que não respeitavam outra autoridade, senão a do trabuco”. Contudo, foi o fervor devoto dos Antunes, proprietários da “Fazenda da Serra”, além da distância com a igreja de Jacuí, que motivou a oferta do terreno para a construção de uma capela em homenagem a São Sebastião, santo sobre o qual tinham ouvido falar que era soldado romano e de forte espírito guerreiro.
Cercada de folhas de indaiá e coberta de capim, a primeira capelinha foi erguida no local exato onde hoje se encontra a Sorveteria Sposito e pouco tempo depois, passou a ser rodeada por algumas famílias que se estabeleceram em seu entorno. Sobre isto houve severa discordância por parte dos Antunes, o que ocasionou grande rixa, todavia, a história demonstra que desde então, a cidade só cresceu.
Os Antunes eram brasileiros natos, mas muitos dos primeiros homens e mulheres que fincaram suas estacas por aqui vieram diretamente de Portugal. Naquele tempo ainda não havia café, pois os primeiros cafeeiros foram plantados em 1866. Também não havia padre, pois o primeiro só chegaria a Paraíso em 1845. No entanto, havia homens bravos, guerreiros e devotos; havia também muitos homens inteligentes e bons negociantes.
No coração dos Antunes não havia a ideia de erguer uma cidade por aqui, mas como as cidades se formam em torno das águas, ou ainda, da fé e da devoção das pessoas, parece que São Sebastião do Paraíso pregou uma peça no doador de seu terreno, nascendo de maneira orgânica, brotando direto da terra, alheia a vontade do latifundiário.
Sobre o adjetivo “Paraíso” agregado ao nome do santo, diz-se que certo capitão Antônio Soares Coelho, ao examinar o terreno a ser doado para a capela, exclamou: “Isto aqui é um Paraíso”. Esta foi a resposta do homem a espetacular visão da serra tomada pela vegetação nativa que misturava de maneira harmônica os biomas da mata atlântica ao do serrado, ornamentada pelos icônicos e floridos ipês, em contraste ao esplendoroso azul do céu claríssimo e, ainda, abençoada pelo clima de notável suavidade.
A exclamação que renomeou a Serra de São Sebastião, apelidando-a por seus ares quase edênicos, ainda ecoa nos lábios dos moradores da cidade, dos saudosos filhos distantes em visita à terra querida e também por aqueles que, assim como o capitão Antônio Coelho, avistam-na pela primeira vez.
Ontem, hoje e sempre temos certeza de que ‘isto aqui é um Paraíso!’”

Fontes de pesquisa:
Instituto ABC;
Livro “São Sebastião do Paraíso e sua história”, de José de Souza Soares;
Brasil Escola.

Comentários